Em última análise, amor e compaixão acarretam a maior felicidade simplesmente porque nossa natureza as valoriza acima de tudo o mais. A necessidade de amor repousa no verdadeiro fundamento da existência humana. Resulta da profunda interdependência que todos repartimos uns com os outros. Por mais capaz e hábil que seja o indivíduo, se deixado só, ele ou ela não sobreviverá. Por mais vigorosa e independente que possa se sentir uma pessoa durante os períodos mais prósperos da vida, quando ela estiver doente, ou muito jovem, ou muito velha, ela precisará depender do apoio de outros.
Interdependência é claro, é uma lei fundamental da natureza. Não apenas formas mais elevadas de vida, mas, até mesmo muitos dos menores insetos, são seres sociais que, sem qualquer religião, lei ou educação, sobrevivem através de mútua cooperação baseada num reconhecimento inato de sua interconexão. O nível mais sutil do fenômeno material também é governado pela interdependência. Todos os fenômenos do planeta que habitamos, nos oceanos, nuvens, florestas e flores que nos circundam, se manifestam em interdependência por meio de sutis padrões de energia. Sem uma interação adequada, eles se deterioram e se dissolvem.
Nossa necessidade de amor repousa no verdadeiro fundamento da existência humana, pelo fato de que nossa própria existência humana é tão dependente da ajuda de outros. Portanto, necessitamos de um genuíno senso de responsabilidade e, de uma sincera preocupação pelo bem-estar de outros.
Devemos levar em consideração o que nós, seres humanos, realmente somos. Não somos como os objetos fabricados por máquinas. Se fôssemos apenas entidades mecânicas, então as próprias máquinas seriam capazes de aliviar todos os nossos sofrimentos e preencher as nossas necessidades. Todavia, por não sermos apenas criaturas materiais, seria um erro colocarmos todas as nossas esperanças por felicidade somente no desenvolvimento exterior. Em vez disso, deveríamos levar em consideração nossas origens e nossa natureza, para descobrirmos o que necessitamos.
Deixando de lado a complexa questão da criação e evolução de nosso universo, podemos ao menos concordar que cada um de nós é um produto de nossos pais. Em geral, nossa concepção não se deu apenas no contexto do desejo sexual, mas, da decisão de nossos pais de ter um filho. Tais decisões estão fundamentadas em responsabilidade e altruísmo, o compromisso compassivo dos pais de cuidar de seu filho até que ele seja capaz de cuidar de si mesmo. Portanto, a partir do verdadeiro momento de nossa concepção, o amor de nossos pais está diretamente em nossa criação.
Além disso, somos completamente dependentes da atenção de nossas mães desde os mais tenros estágios de nosso crescimento. De acordo com alguns cientistas, o estado mental de uma mulher grávida, seja ele calmo ou agitado, tem um efeito físico direto no filho ainda em estágio de formação.
A manifestação de amor também é muito importante na hora de dar à luz. Visto que a primeira coisa que realmente fazemos é sugar o leite do seio materno, nós naturalmente nos sentimos ligados a ela e, ela deve sentir amor por nós para nos alimentar adequadamente, se ela sentir raiva ou ressentimento, seu leite poderá não fluir livremente.
Há então o crítico período do desenvolvimento do cérebro, desde o nascimento até ao menos a idade de três ou quatro anos, quando o contato físico amoroso é o fator mais importante para o crescimento normal da criança. Se a criança não for abraçada, amparada, afagada ou amada, seu desenvolvimento será prejudicado e seu cérebro não amadurecerá apropriadamente.
Visto que a criança não pode sobreviver sem o cuidado de outrem, seu mais importante alimento é o amor. A felicidade da infância, a pacificação dos inúmeros temores da criança e, o desenvolvimento salutar de sua autoconfiança, tudo depende diretamente do amor.
Hoje em dia, muitas crianças crescem em lares sem felicidade. Se elas não recebem afeição adequada, mais tarde na vida, raramente amarão seus pais e, não raro, terão dificuldade em amar outros. Isto é muito triste.
A medida que as crianças crescem e vão à escola, suas necessidades de apoio precisam ser supridas por seus professores. Quando um professor não apenas compartilha educação acadêmica com seus alunos, mas, também assume a responsabilidade de prepará-los para a vida, seus alunos ou alunas sentirão confiança e respeito e, o que lhes tiver sido ensinado causará indelével impressão em suas mentes. Ao contrário, assuntos ensinados por um professor que não demonstrou preocupação verdadeira pelo bem-estar geral de seus alunos, serão considerados apenas temporariamente e, não serão retidos por muito tempo.
Do mesmo modo, se algum doente é tratado num hospital por um médico que evidencia o sentimento de calor humano, ele se sentirá à vontade e, o desejo médico de dar a melhor atenção possível é, por si só, curativo, independentemente do grau de especialização médica. Ao contrário, se o médico de alguém carecer de sentimento humano e demonstrar uma expressão pouco amigável, impaciência ou desconsideração casual, esse alguém se sentirá ansioso, mesmo que o médico seja da mais alta qualificação, que a doença tenha sido corretamente diagnosticada e, que a medicação correta tenha sido prescrita. Inevitavelmente, os sentimentos do paciente fazem a diferença na qualidade e na extensão de sua recuperação.
Até mesmo quando nos envolvemos em uma simples conversa em nossa vida diária, se alguém fala com sentimento humano, temos prazer em ouvir e, responder do mesmo modo: toda a conversa se torna interessante, por menos importante que seja o assunto. Ao contrário, se uma pessoa fala de modo frio e duro, sentimo-nos pouco à vontade e desejamos que aquela interação termine logo. A afeição e o respeito pelos outros são vitais para nossa felicidade em qualquer circunstância, desde o menos significativo, até o mais importante evento.
Recentemente, me encontrei com um grupo de cientistas norte-americanos que diziam que a taxa de doenças mentais em seu país era muito alta, ao redor de doze porcento da população. Durante nossa discussão, tornou-se claro que a principal causa da depressão não era a falta de necessidades materiais, mas, carência da afeição de outrem. Portanto, como você pode ver de tudo o que escrevi até aqui, uma coisa me parece clara: quer estejamos conscientemente atentos a isso, ou não, a necessidade de afeição humana está em nosso próprio sangue, desde o dia em que nascemos. Mesmo que a afeição venha de um animal, ou de alguém que normalmente consideraríamos um inimigo, tanto crianças como adultos, naturalmente gravitarão ao redor dela.
Acredito que ninguém nasce livre da necessidade de amor. E, isto demonstra que, ainda que algumas modernas escolas de pensamento procurem fazê-lo, seres humanos não podem ser definidos como sendo apenas físicos. Nenhum objeto material, por mais belo ou valioso, pode nos fazer sentir amados, porque nossa mais profunda identidade e verdadeiro caráter repousam na natureza subjetiva da mente.
Fonte: http://www.dalailama.org.br
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