Ainda existe muita dúvida e preconceito com relação ao Omoloko, importante religião de matriz africana praticada no Brasil. Segundo Léa Maria Fonseca da Costa, a palavra Omoloko deriva do Iorubá, “Omo” que significa “Filho” “Loko” referindo-se a árvore Iroko e tem o sentido de algo como “Filhos da Gameleira Branca”.
Em outra interpretação, não antagônica, versada por Tancredo da Silva Pinto - 'Tatá Ti Inkice' (pai de santo de Angola) -; em seu livro 'Culto Omolokô: Os Filhos de Terreiro', Omolokô significa: “Omo” -Filho e “Oko” - fazenda, zona rural, onde este rito religioso era realizado. Os rituais Omoloko; por conta da repressão policial que havia contra religiões de matriz africana durante a época do Brasil Colônia, eram realizados na mata, ou em lugar de difícil acesso dentro das fazendas dos colonos escravagistas.
Pode-se também, e de forma correta, relacionar o significado da palavra Omolokô ao Orixá Okô, Orixá da agricultura, que era adorado nas noites de lua nova pelas mulheres cultivadoras de inhame. Nos primórdios, da colonização brasileira pelo império português, o Orixá Okô era muito popular no Rio de Janeiro.
Desvendando o Culto Omoloko
"A desinformação sobre o Omolokô foi e é provocada pela combinação de vários fatores.
Primeiro porque o povo Bantu, ponto de partida desse culto, era particularmente dado ao isolamento e muito mais reservados que os demais negros que aportaram no Brasil. Eles supunham manter desse modo, os segredos de culto intactos, mas na realidade isso acabou por gerar inúmeras distorções, vividas até os dias de hoje.
Segundo porque muitos dos antigos Sacerdotes do culto foram morrendo e levando consigo boa parte do que sabiam. Terceiro por causa dos ensinamentos passados pela transmissão oral, visto que pela oralidade restringia-se apenas a memória dos mais confiáveis e graduados iniciados, a guarda dos fundamentos. Memória muitas vezes falha, que levou simplesmente ao esquecimento de muitas das preciosidades originais e dos fundamentos do culto.
Por fim a dificuldade de se levantar arquivos, registros históricos, matérias, artigos, documentos e demais fontes de consulta, desestimulam ao estudo e a redescoberta do culto." (fonte)
A seguir, após a breve introdução acima colocada e, para entendimento mais amplo, que não seja apenas o mero entendimento antropológico; transcrevo (Agô!), como pedem os Orixá, texto disponibilizado contando a história do Omolokô no Brasil.
"Segundo nosso entendimento, o Omoloko começou a existir como uma das variantes de religião afro-brasileira que passou a ser praticada no Brasil a partir de algum tempo no passado, depois da chegada dos escravos negros. Provavelmente de maneira precária no início, pela falta de liberdade dos escravos para qualquer tipo de organização, mas, com o decorrer do tempo e com as leis que foram aos poucos mudando as condições de vida dessas pessoas, de maneira mais organizada e completa – e o Omoloko, nesse particular, em nada difere das outras variantes religiosas afro-brasileiras.
O que o torna particular é que ele se estruturou inteiramente no Brasil, tendo influência de diversos rituais religiosos africanos, principalmente os dos povos que vieram de regiões que hoje são o Congo, Angola, Moçambique, Nigéria, Benin, Camarões – e, portanto, diferente dos Candomblés, por exemplo os de origem Yoruba, que ainda hoje guardam forte predominância de influência de sua região de origem, e aqui se organizaram obedecendo a um padrão religioso e cultural já preestabelecido nessas origens.
O Omoloko fazia parte do que se chamava, nos fins do século XIX e início do século XX, de Makumba, no Rio de Janeiro; segundo os estudiosos, também a Makumba se originou de diversas procedências, conforme a influência de suas regiões de origem na África; assim, existia a Makumba Mina, a Rebolo, a Cabinda, a Congo, etc.
O Omoloko organizou-se majoritariamente na Zona da Mata em Minas Gerais, no estado do Rio de Janeiro, no nordeste do estado de São Paulo e em parte do Espírito Santo; o nome é Yoruba e existem várias opiniões a respeito de seu significado. Uns dizem que significa "filhos do tempo", porque no início, devido à falta de recursos, seus adeptos praticavam-no ao ar livre, ou debaixo das árvores, ou debaixo das árvores chamadas Iroko.
Outros atribuem à palavra sentido mais literal e abrangente, como "filhos da fazenda", ou mesmo "filhos da roça", designando os negros vindo do meio rural e que professavam tal religião, haja vista serem muitas dessas organizações estabelecidas mesmo nas roças, ou em áreas afastadas das cidades.
O Omoloko praticado por nós foi instituído por uma escrava, nascida na África, que no nosso meio ficou conhecida como Maria Batayọ.
História de Batayọ
Maria Batayọ nasceu por volta de 1.797 na África. Veio com vinte anos como escrava para o Brasil, para trabalhar numa fazendo do estado do Rio de Janeiro. Foi embarcada no Forte da Mina e tinha procedência Mina Je San, segundo uma das versões; outra versão conta que Batayọ era uma negra Bini, que são os habitantes da região da cidade de Benin na Nigéria, povo que reivindica para si descendência dos Yoruba de Ife. Seus contemporâneos de culto afro-brasileiro no Brasil diziam dela que era Nago, quando queriam compará-la com outros praticantes do Omoloko. Já veio feita da África, era de Nanan e foi feita por Sanguerabu, um africano que nunca pisou o solo brasileiro e que era das terras de Egun (também conhecido como Popo ou Je), povo de língua da família Ewe, nas cercanias de Porto Novo, na Baía de Benin, no litoral do antigo Daomé, atual Benin.
Seu nome, de fato, parece ter sido Tayọ. Era chamada assim na fazenda em que trabalhou. "Ba" talvez tenha sido agregado mais tarde, talvez nos meios religiosos afro-brasileiros que freqüentou, e "Maria" foi o nome adotado em terras brasileiras.
Batayọ era escrava doméstica e trabalhava na cozinha; teve impaludismo (malária) e curou-se tomando chá de fedegoso. Enquanto esteve doente e convalescendo, uma prima sua, não escrava, muito boa cozinheira, foi ajudá-la nos serviços. Batayọ aprendeu muito com essa prima e se revelou com ótimas qualidades, acabando por se transformar numa cozinheira tão boa quanto a outra.
A pedido da filha da fazendeira, Sinhazinha, Batayọ foi transferida para outros serviços domésticos, dentro da casa grande. Nesse tempo, Sinhazinha namorava um rapaz de uma fazenda vizinha e, passeando com ele a cavalo, caiu e machucou a cabeça. Ficou muito mal e foi salva por Batayọ, mas esteve pelo resto da vida sujeita a crises nervosas e, por isso, passou a ser cuidada pessoalmente por Batayọ, a quem se apegou ainda mais.
Sinhazinha casou-se com esse namorado, do qual teve alguns filhos, entre mulheres e homens. Um desses homens tornou-se major do Exército, e mais tarde foi feito no santo por Batayọ, na futura Roça dela, no morro de São Carlos, na cidade do Rio de Janeiro.
O marido de Sinhazinha, um dia, castigou demais um escravo, mandando chicoteá-lo no tronco até quase à morte. O negro sobreviveu e depois de recuperado matou o fazendeiro a facadas. Sinhazinha, prejudicada pelo seu estado nervoso, ao saber do ocorrido, teve um colapso e morreu. Só que, antes disso, já havia alforriado Batayọ, como recompensa pelo cuidado que sempre tivera com ela, e depois com seus filhos, ajudando-a a criá-los; além disso, ainda lhe comprara o terreno do morro de São Carlos, para que um dia Batayọ tivesse onde morar, datando daí a posse desse terreno.
Quando Sinhazinha morreu, por volta de 1.867, Batayọ tinha cerca de setenta anos. Muito velha para viver na fazenda, veio para a cidade e ocupou sua terra no morro de São Carlos, fundando a Roça (terreiro) e iniciando sua vida de mãe-de-santo.
Batayọ casou-se no Brasil, teve vários filhos naturais e fez vários filhos-de-santo em sua Roça. Apesar de ter vindo feita da África, aprendeu com africanos ex-escravos muito sobre os fundamentos das religiões africanas praticadas aqui no Brasil naquela época, especialmente o Omoloko, tanto durante o período em que viveu na fazenda quanto em seu primeiro ano na Roça do morro de São Carlos.
Batayọ teve vários filhos-de-santo:
- Leocádia, de Oşoọsi Arranca Toco, iyalorişa.
- Mané Bertolino, babalorişa que fez Severino, de Şango, por sua vez babalorişa que fez Chico Diabo, ogan; Leba Jui, babalorişa e Manezinho, de Ogun, babalorişa. Manezinho fez Sizenando, de Yemọja, babalorişa.
- Tuti, de Şango, babalorişa.
- Heitor, de Şango, babalorişa que fez Saul, de Ogun, babalorişa.
- Joana de Yemọja, iyalorişa que fez Délia, de Ọya, iyalorişa, e Maria-Faz-Força, de Iyasan, iyalorişa, que fez Bibi, de Oşoọsi, iyalorişa, que fez Antoninho, babalorişa, de Oşoọsi Folha Seca.
- Tomate, de Ogun, pejigan e filho natural mais novo de Batayọ, a quem ela ameaçava punir com uma "coça" quando achava que ele não se comportava de maneira correta. Isso foi presenciado por Fujẹko que, quando contava, ria, visto que Tomate, por essa época, já havia passado dos 80 anos de idade – segundo ele, mais de 84 anos.
- Guiomar de Mungongo, de Oşoọsi, iyalorişa, que fez Miguelão, de Şango, ogan.
- Mano Otávio, de Şango, babalorişa.
- Roxinha, de Ọşun e Oşoọsi, iyalorişa, também filha natural de Batayọ, que junto com Henriqueta completou as obrigações de Fujẹko.
- Henriqueta, de Nanan, iyalorişa que junto com Roxinha completou as obrigações de Fujẹko, de Şango Agodo, e lhe deu o deka, confirmando-o babalorişa.
- Edgar Canivete, de Şango Alafin, babalorişa.
- Guiomar de Şango de Ouro, de Şango, iyalorişa.
- Tio Mina.
- Jerônimo, de Şango.
- Hildebrando, ogan.
- O major, filho da Sinhazinha.
- Maria.
- Fujẹko de Şango Agodo (Gérson Gentil de Azevedo).
Batayọ morreu aos 129 anos, por volta de 1926, na Roça do morro de São Carlos, onde, além de ter sua Casa-de-Santo, também morava.
Anunciou sua própria morte algum tempo antes. Nove pessoas presenciaram sua passagem: Samuel, "Seu" Chaves, Ricardina, Henriqueta, Mistura, Tuti, Tẹko, Edgar Canivete e Fujẹko, que tinha então 13 anos de idade. Para este último, ela disse que, quando ele tivesse entre 36 e 39 anos de idade, alguém, que não estava ali, iria cobrir sua casa de flores e pétalas no chão, para receber o Santo dele, no momento em que ficasse pronto. De fato isso aconteceu, quando Lili, que não era filha de Batayọ, nem de sua descendência nem ascendência e que sequer chegou a conhecer Batayọ, ficou encarregada disso na casa onde Fujẹko mais tarde residiria, depois de concluídas suas obrigações com Roxinha e Henriqueta.
Roxinha, sua filha natural e filha-de-santo, fez o aşeşe de Batayọ, tirou a mão-de-vumi dos filhos de Batayọ e deu saída ao ẹbọ de seus Santos. Depois disso, a Roça do morro de São Carlos esteve fechada por seis meses, ficando Roxinha como sua sucessora.
Vinte anos após morreu Roxinha, por volta de 1.946. Henriqueta ainda ficou na roça, mas os netos de Batayọ tomaram posse da propriedade e o Terreiro acabou. Henriqueta fundou então um Terreiro em Bento Ribeiro, na cidade do Rio de Janeiro, e morreu quatro anos após Roxinha, por volta de 1.950.
Os contemporâneos de Batayọ e seus respectivos descendentes que praticavam o Omoloko no Rio de Janeiro eram:
1. Dona Jeje, de Şango, iyalorişa; viveu perto de 100 anos.
2. Chica Boi, de Iyasan e Oşoọsi, iyalorişa; viveu perto de 70 anos. Fez: Orlandino da Cobra Coral, de Oşoọsi, babalorişa, que fez Orlando do Pó, de Omolu, babalorişa, Virgílio Cipozeiro, de Oşoọsi, babalorişa, e Mistura, de Ogun, alabe.
3. Mosinha, de Ọşun, iyalorişa, viveu perto de 100 anos; era filha-de-santo de Tia Chica de Vavá, de Yemọja com Şango, que era negra nagô, viveu perto de 90 anos e morreu em Abolição, Rio de Janeiro. Mosinha teve os seguintes filhos-de-santo: Cai n'Água, de Oşoọsi e Ọşun, babalorişa; Ricardirna, de Oşala, iyalorişa, que fez Ana Cachorro, de Iyasan, runsol e Alexandre de Ọbaluaiye, babalorişa; Zé Spingéli, nome provável José Gomes da Costa, de Şango, babalorişa, que fez Cecília, iyalorişa e Cacheado, de Iyasan, babalorişa, que fez Lili do Coqueiro, de Oşoọsi, iyalorişa, que fez Lourdes, iyalorişa, que abandonou o Omoloko e passou para o Candomblé Angola, tornando-se filha de Néris. Antes, Lourdes havia feito Ildérica, de Ọbaluaiye e Yemọja, que no ínicio da década de 1.970 tinha uma casa de Omoloko em Sobradinho, cidade satélite de Brasília.
4. Deawe, de Oşoọsi, babalorişa, filho natural de Batayọ, viveu perto de 100 anos. Fez Custódio Caravana, de Oşoọsi Arranca Toco, babalorişa que viveu 72 anos.
5. Sarah, viveu perto de 100 anos. Fez os seguintes filhos-de-santo: "Seu" Chaves, de Ogun Meje, babalorişa; Samuel, de Şango, oşogun; Mano Elói, nome provável Elói Antero Dias, de Şango, babalorişa; Benedito Perna Seca ou Benedito Espírito Mau, de Iyasan, babalorişa.
6. Tião, de Şango, viveu 60 anos.
7. Dona Mariquinha, de Ọşun, iyalorişa. Fez: Tiana, de Ogun, iyalorişa; Porfírio, de Şango, oşogun; Tia Cláudia, de Iyasan Garuana, iyalorişa; Maria Capoeira, de Oşoọsi e Iyasan; Guaraná, de Şango, babalorişa, que fez Dona Chica, de Ọşun, iyalorişa, que fez Tia Josefa, iyalorişa, que fez Maria Augusta, de Omolu, iyalorişa, que fez Sinhô, de Oşoọsi, babalorişa, e Djama de Alalu, de Oşoọsi e Iyasan, que abandonou o Omoloko, passando para o Candomblé Ketu, filho de Fumotin, por quem acabou sendo feito para Eşu Lalu.
8. Chica Velha (tronco vindo da Zona da Mata de Minas Gerais, conhecida nessa época por "África Mineira"), iyalorişa, que fez Lili, de Şango e Ọşun, iyalorişa.
9. Eleotério, viveu perto de 110 anos, de Omolu, babalorişa, fez: Soféria do Soferão, de Osanyin, iyalorişa, que fez Sinhô de Sete Pedras, de Iroko, babalorişa.
10. Chico Velho, de Oşumare, babalorişa. Fez Neném do Bambual, de Ọşun, iyalorişa, que fez Ercília de Arruda, de Ogun e Ọşun, iyalorişa.
11. Maria de Nanan Buruke, de Nanan, viveu 80 anos, iyalorişa, que fez "Seu" Domingos, de Şango, babalorişa; Militão, babalorişa, que fez Paulo Demandista, de Oşoọsi, babalorişa.
12. Tio Chico, de Ogun, babalorişa, irmão natural de Batayọ.
13. Bakayọdẹ, morreu com 105 anos; era babalorişa de Şango e tinha um irmão-de-santo, La Grossa, de Bẹsẹn, babalorişa.
14. Inhá, de Iyasan, iyalorişa, que fez: Ezinho, de Ọşun, ogan; Raul, de Oşoọsi, alabe; Farrel, de Oşoọsi, alabe; Geraldo, de Ogun, ogan; Cláudio, de Şango das Almas, babalorişa.
15. Tia Fé, nome provável Fé Benedita de Oliveira.
Nota sobre a origem de Maria Batayọ
Para tentar descobrir a origem de Batayọ, ou Tayọ, partiremos do princípio muito provável que o nome dessa yalorişa seja Yoruba e que Sanguerabu seja um nome pertencente a uma língua da família Ewe. Essa afirmação baseia-se também na história contada acima e no fato óbvio de que Batayọ teria que ter convivido com Sanguerabu. Os dados conhecidos, aparentemente inconciliáveis, dão a ela diversas origens, ou seja, Nago, Mina Je San, Bini e de procedência do Porto da Mina. Há ainda o fato de ela ter nome Yoruba e ser filha-de-santo de um babalorişa de origem Egun, povo também conhecido como Popo ou Je.
Pensamos que, sendo Batayọ Bini, ou descendente de Bini, seria ela também Yoruba. Conforme já vimos, o povo Bini se considerava descendente dos Yoruba de Ife, e muito provavelmente, então, ela teria convivido com Sanguerabu, ou em terras Yoruba, ou em terras dos Egun (ou Popo ou Je), ou em terras de fronteira ou de vizinhança desses dois povos. No primeiro caso, sendo Bini, poderia ter nascido e se criado numa região de fronteira, o que era uma possibilidade concreta, pois havia povos, entre eles os Egun (ou Popo ou Je), todos de língua da família Ewe, que ocupavam a região litorânea da Baía de Benin, indo desde o Gana, no sentido oeste-leste, até Badagri, onde se encontravam com os Bini, que habitavam a parte litorânea dessa região e que vinham desde a Cidade de Benin, no sentido oposto, leste-oeste. Já os Yoruba localizavam-se no interior desse litoral.
Sendo ela de descendência Bini, teriam seus antepassados migrado para uma região que fizesse fronteira com Egun (ou Popo ou Je), mas que fossem terras Yoruba e não terras Bini. Essa região poderia ser a antiga Província de Colônia, que circundava Lagos, ou até mesmo essa cidade da Nigéria. Hipótese também possível, visto que, nessa cidade, no século XV, foi estabelecida uma dinastia Bini, tendo Lagos pago tributos a Benin até 1830. Além disso, houve um intenso comércio de negociantes escravagistas portugueses entre essas duas cidades.
Maria Batayọ poderia ter nascido também em um distrito chamado Egun-Awori, na região de Badagri, no antigo Protetorado Britânico, perto de Lagos, onde a população era constituída de pessoas de Egun e de Awori. Awori é um povo que se estabeleceu em Lagos na época da dominação Bini sobre essa cidade; neste caso, por exclusão, não sendo Awori, pois isto não foi mencionado como sendo uma de suas origens, ela seria Je, como conta sua história – Je (ou Egun ou Popo), ou de origem Yoruba e nascimento Je.
Outra origem provavel seria nas terras dos Anago, ou Nago, região no interior do antigo Daomé, que fazia fronteira com o reino de Ketu, com as terras dos Egbado e as dos Awori no interior e com os Egun (ou Popo ou Je), no litoral. Ali existiam comunidades Egbado, de população majoritariamente constituída de uma mistura de Anago (ou Nago), e Egun (ou Popo ou Je), o que nos levaria a supor que ela poderia ser Anago (ou Nago). Essa hipótese confirma mais uma vez sua condição Yoruba, sendo ou não de descendência Bini, visto que, para os daomeanos, todos os Yoruba do Daomé eram considerados Nago (ou Anago).
Existia também um povo denominado Ahori, que talvez não tenha origem Yoruba mas que adotou língua e cultura Yoruba e habitava as terras dos Anago, já na fronteira com os Ketu. Esse povo se autodenominava Dje. Os Egun (ou Popo ou Je) os conheciam, tanto que os chamavam de Holi. Os Ahori não habitavam terras que fizessem fronteira com aquelas ocupadas pelos Egun (Popo ou Je), mas poderiam se relacionar com eles. Isso é possível pelo fato de que tanto os Egun (ou Popo ou Je) das comunidades Egbado quanto os Ahori (ou Holi ou Dje) habitarem as terras dos Nago (ou Anago). Se Batayọ tivesse nascido aí, seria uma Dje, mas talvez fosse considerada também Yoruba pelos Egun (Popo ou Je), pelo fato de ser Bini. Nesse caso também seria considerada Nago (ou Anago) por eles, por ser Yoruba do Daomé. Assim Batayọ tanto seria Dje, Je, Nago, Yoruba descendente de Bini ou Bini.
No Rio de Janeiro, no século XIX, período em que Batayọ chegou ao Brasil, os Iorubá que desembarcavam na cidade procedendo de qualquer região da África ou do Brasil eram chamados de Nago. Analisando por esse ângulo, Batayọ poderia ser considerada Nago pelos seus contemporâneos no Brasil por ser mesmo Nago, sendo Yoruba do Daomé, ou por ser realmente Yoruba de outra região africana. O fato de também ser considerada Mina pode ser explicado por ela ter embarcado para o Brasil no Forte da Mina, que fica na região conhecida igualmente como Costa da Mina, que abrange o Forte de São Jorge da Mina, em Gana, e a Baía de Benin. Nesse caso ela seria conhecida como Mina-Nago, como eram denominados os Yoruba embarcados na Costa da Mina levados para o Rio de Janeiro no século XIX.
Porém Batayọ era Mina Je San. Ela poderia ser Je (Popo ou Egun), conforme já vimos. Além disso, Dewae, um de seus filhos naturais, tem nome de origem provável Je. Ora, já sabemos por que ela poderia ser Mina. Mas para ser Je, aparentemente não poderia ser Yoruba, mas seu nome é Yoruba. Poderia ainda ser considerada Yoruba mesmo se tivesse nascido em terras Je, caso fosse descendente de Bini, de acordo com o já visto. Nesse caso ela poderia ser tida como Nago no Brasil, sem nenhuma contradição em ser Mina Je.
O que concluímos é que não podemos ainda precisar o local exato do nascimento de Maria Batayọ, talvez porque falte desvendar o que seja San na palavra Jesan ou na frase Je San. Talvez, mesmo se descobrirmos, não possamos decifrar a questão. No entanto, se não apresentamos nenhuma novidade para muitos leitores, pelo menos afirmamos alguns pontos que consideramos como certos: Batayọ ou era das terras dos Nago do antigo Daomé, atual Benin, ou era da região de Lagos/Badagri na Nigéria – e, com certeza, era Yoruba no sentido mais amplo da palavra.
História de Fujẹko
Fujẹko, Gérson Gentil de Azevedo, nasceu na casa de número 12 na rua Cândido Benício, que sai do Largo do Campinho e vai para Jacarepaguá, em Cascadura, Rio de Janeiro, em 25 de outubro de 1.913. Eram duas casas, a de número 10 e a 12, que ficavam ao lado de um posto de saúde, e talvez já não existam. Era filho de Gelásio Gentil de Azevedo, baiano, e Graziella Bayão de Azevedo, sergipana, que faleceu quando Fujẹko contava com seis anos de idade.
Teve os seguintes irmãos: José Salvador Bayão de Azevedo, o Zequinha, ou Bayão; Moacir Bayão de Azevedo; Lourdes Bayão de Azevedo; Haydê Bayão de Azevedo, que morreu intoxicada aos quatro anos de idade; Zuleika Bayão de Azevedo e Jair Bayão de Azevedo, gêmeos, sendo que Jair morreu com cerca de quatro meses de idade.
Segundo o próprio Fujẹko, desde muito cedo, aos sete anos, ele bolou para o Santo; então, Dona Lúcia [vizinha de sua família ao tempo em que Fujẹko era criança, no Largo do Campinho, antigo beco Maria José], mãe de quatro filhos [Lara, Pedro, Jovem (mulher) e Anenor], amiga da família em decorrência de vizinhança, levou Fujẹko para o Terreiro de Tio Abẹdẹ.
Fujẹko, porém, ali não ficou muito tempo, indo para a Casa de Tia Chica de Vavá, de onde saiu para a casa de Batayọ, aí ficando até depois da morte dela, lá permanecendo com Roxinha e Henriqueta.
Batayọ iniciou Fujẹko, seu trigésimo-sexto e último filho-de-santo. O major, filho da Sinhazinha, foi quem custeou a obrigação dele. Sua mãe-criadeira foi Maria de Lembra Tudo. Roxinha e Henriqueta fizeram as obrigações posteriores e Henriqueta lhe deu o dẹka – e quem recebeu o seu Santo com flores, na casa onde então morava, foi Lili, isso entre os 36 e 39 anos de Fujẹko, entre 1949 e 1952, ou seja, quando Roxinha já tinha falecido, e como predissera Batayọ.
Bakayọdẹ, de Şango, irmão-de-santo de Batayọ, foi quem deu e ensinou o jogo de búzios para Fujẹko. Após aprender e receber o jogo, a primeira pessoa para quem Fujẹko jogou foi o próprio Bakayọdẹ. Nesse jogo ele viu a morte de Bakayọdẹ.
Fujẹko, antes de ter Casa, ficou no Terreiro de Ercília, de Caboclo Arruda, de Ogun e Ọşun, iyalorişa, durante 10 anos, provavelmete desde 1944, dois anos antes da morte de Roxinha e seis antes da morte de Henriqueta, até 1954.
Embora tenha sido feito em casa de Batayọ, disse que aprendeu muito do que sabia com Custódio Caravana, de Oşoọsi, babalorişa, filho de Deawe, filho natural de Batayọ.
Fujẹko fundou sua Casa-de-Santo, denominada Tenda Espírita dos Humildes, em 4 de dezembro de 1954, no Beco Rita Vieira, hoje Rua Rita Vieira, número 40, em Madureira, Rio de Janeiro, então Distrito Federal.
Fujẹko teve muitos filhos-de-santo; entre os que receberam o dẹka, estão: Noêmia de Marabo, de Yemọja com Oşoọsi, com Terreiro em Itapocu, Vitória, Espírito Santo; Tereza, de Iyansan e Şango, com Terreiro no estado do Rio; Mozart, de Şango e Ọşun; Fátima, de Oşalufan; Regina Lúcia Ruiz de Gamboa, de Ọşun; Palu, de Obaluaiye; Maria Antônia de Jesus Melo, de Ọbaluaiye; Maria Luiza; Jandira, de Oşoọsi; Mitze; Eiya, de Omolu; Ângela; Ruth de Souza Castro, de Obaluaiye e Ọşun. Entre outros seus filhos feitos estão Pedro, de Şango, pejigan; Ari Barreto de Oşoọsi, ogan; Odete, de Şango, jibonan; Eurico Jacy Auler, de Şango Agodo, oşogun; as mães-pequenas Hilda, de Ogun; Corina, de Şango; Ida, de Omolu; Yeda; Bichinha; e Angra, de Omolu e Iyansan; Maria Alice, iyabase; além de Jorge (Dedei), de Obaluaiye, filho natural de Hilda de Ogun; Gamboa, de Oşoọsi, marido de Regina Lúcia; Afonso e sua esposa Dina; Jeová; Iara; e o marido de Maria Alice e Carmem.
Fujẹko casou-se com Ilka Machado de Azevedo, nascida em 26 de junho de 1914, em 20 de maio de 1935; não teve filhos naturais e morreu em 1º de junho de 1977. Depois de sua morte, seu irmão Zequinha, de Ọşun, feito por Regina Lúcia, vendeu a propriedade e o Terreiro acabou. Hoje, permenece fechado e vazio, parece que sem qualquer uso ou destino.
História de Maria Antônia
Maria Antônia de Jesus Melo nasceu em Fortaleza, Ceará, filha de Maria Marques de Oliveira Melo, nascida em Jardim, Ceará, e Jairo Bandeira de Melo, do Rio Grande do Norte. Era católica e de família católica. Quando nasceu tinha um irmão já adulto, por parte de pai. Teve mais quatro irmãos por parte de pai e mãe - três homens, que morreram crianças, e uma irmã. Mudou-se para o Rio de Janeiro aos 16 anos com a família, em 1948, para a rua Coração de Maria, no Méier.
Casou-se em 1950, com João de Oliveira, só no religioso, visto ser ele separado da mulher, e foi morar na rua Sabino Ribeiro, em Irajá. Teve duas filhas naturais – Cleane de Oliveira e Márcia Cristina de Oliveira. Maria Antônia começou a ficar doente logo depois do casamento. Por causa disso, foi aconselhada por D. Raimunda, médium atuante de um centro espírita kardecista e mãe do chefe desse centro, Rodrigues, a consultar-se espiritualmente ali. Depois disso, começou a freqüentar o local, chamado Centro Espírita Bezerra de Menezes, em Cascadura. Porém, continuava sempre doente, e, aconselhada por uma entidade do Centro, que lhe recomendara um Centro que não fosse de mesa, mas que fosse de chão – um Terreiro–, foi à procura de um.
Por sugestão de um colega de trabalho (o marido de dona Mariquinha, zeladora do Terreiro de "Seu" Pena Azul, em Osvaldo Cruz) de seu marido, começou a freqüentar esse Terreiro, onde começou a ter as incorporações da Preta-Velha Tia Maria da Bahia, do Caboclo Aracati e de Ogun Beira Mar. Mas, mesmo assim, continuava bem doente e emagrecendo.
Depois de algum tempo, foi aconselhada por um guia incorporado do Terreiro a procurar um Terreiro de Nação. Por isso, aconselhada por uma sua conhecida da época, foi ao endereço, que era numa rua de Madudeira, procurar o tal Terreiro de Nação. Estava procurando o endereço, quando uma mulher a quem pediu informação lhe disse que aquele ela não conhecia, mas que conhecia um muito bom ali perto, e que ela estava indo lá, para falar com o pai-de-santo, Fujẹko; desse modo, ela dirigiu-se com a mulher à Tenda Espírita dos Humildes, Terreiro de Aşẹ Omoloko, localizado à rua Rita Vieira, 40, cujo babalorişa era Gerson Gentil de Azevedo, o Fujẹko, o qual, depois de atender à mulher e à filha dela, fez um jogo para Maria Antônia, orientando-a no que deveria ser feito diante dos problemas de saúde que ela estava enfrentando.
Isso já era outubro de 1966, ou dezesseis anos desde que ficara doente e começara a procurar uma solução para seus problemas. Foi logo recolhida e logo feito um bori, depois do que já começou a melhorar de suas doenças. Iniciou-se assim sua vida religiosa naquele Terreiro. Suas filhas naturais receberam também um bori na casa de Fujẹko. Depois de sete anos, em 1973, recebeu o dẹka e o levou, bem como os seus asentọ para sua casa, nessa época já na Estrada Intendente Magalhães em Vila Valqueire, onde reside até hoje. Sua mãe-pequena de feitura foi Hilda, de Ogun.
Em 1983, seis anos depois da morte de Fujẹko, Mãe Maria Antônia fundou seu Terreiro, Ile Aşẹ Ọbaluaiye, nos fundos de sua residência. Desde então tem como filhos com dẹka Paulo de Oşala, com Casa em Icaraí, Niterói, e Isa de Yemọja, com Casa em Ricardo de Alburquerque, Rio de Janeiro.
Em junho de 1999, fez os asentọ do Ileko, Casa de Omoloko, em Brasília, e em novembro fez Cora, de Ogun, Lígia, de Ọbaluaiye, Leni, de Yemọja e Simone, de Iyansan, tendo como mãe-pequena sua filha natural Márcia, feita no Ketu."
Brasília (DF), abril de 2003
Fontes Consultadas:
01 – História de Batayọ contada por Fujẹko, na Tenda Espírita dos Humildes, em 15 de fervereiro de 1974.
02 – História de Fujẹko contada pelo próprio, na Tenda Espírita dos Humildes, em 17 de janeiro de 1970.
03 – História de Maria Antônia contada pela própria e por sua filha Márcia em abril de 2003.
04 – Fala, Mangueira!, Marília T. Barboza da Silva, Carlos Cachaça e Arthur L. de Oliveira Filho, Ed. José Olympio, 1980.
05 – A Linguagem Correta dos Orişa, Benjy Ainde Kayode Durojayle Komolafe, Ornato José da Silva, Rio de Janeiro, 1978.